terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Literatura Sobre Lampião e o Cangaço: O cearense Leonardo Mota (1891-1948) foi jornalista e um dos maiores pesquisadores das coisas do Nordeste. Não o encantava nem ouro e nem prata – abriu mão de uma vida tranquila de dono de cartório -; dedicou-se a percorrer os sertões colhendo palavras. Ano 1930


O cearense Leonardo Mota (1891-1948) foi jornalista e um dos maiores pesquisadores das coisas do Nordeste. Não o encantava nem ouro e nem prata – abriu mão de uma vida tranquila de dono de cartório -; dedicou-se a percorrer os sertões colhendo palavras e histórias diretamente da boca do povo, registrando-as em em seus livros.
Em “Nos tempos de Lampião” [1930] ele escreveu, na primeira parte do livro, histórias sobre o mais famoso cangaceiro que percorreu os sertões nordestinos.
São estas histórias, 11 no total, que vou reproduzi-las neste blog, já que a última edição do livro [a que vocês veem ao lado] é de 1967 – e não foi mais republicado.
O título desta primeira história é “O príncipe”, referência a Lampião. Observem – principalmente os estudantes de jornalismo – que a descrição inicial que o mestre Leonardo Mota faz, tem 224 palavras, antes que ele pingue o ponto final.
Qualquer manual de redação condenaria uma exorbitância dessas. Mas vejam o ritmo, o encadeamento das palavras, que não deixam o leitor se perder, algo que inevitavelmente aconteceria com alguém menos hábil para manejar o vernáculo

O príncipe
AMULATADO e de estatura meã; magro e semicorcunda; barba e nuca ordinariamente raspada; cabelos compridos e, sempre que é possível, perfumados; na perna esquerda, encravada, uma bala, com que o alvejou o sargento Quelé, da polícia, paraibana; o olho direito, branco e cego, escondido pelos óculos pardacentos, de aros dourados; mãos compridas, que semelham garras; os dedos cheios de anéis de brilhantes, falsos e verdadeiros; ao pescoço, vasto e vistoso lenço de cores berrantes, preso no alto por valioso anel de Doutor em Direito; sobre o peito, medalhas do Padre Cícero, escapulários e saquilhos de rezas fortes; chapéu de cangaceiro, tipicamente adornado de correias e metal branco; ensimesmado toda vez que defronta uma turba de curiosos, folgazão quando entre poucos estranhos ou no meio de seus comparsas; não se esquecendo dum guarda-costa vigilante, à direita, sempre que desconhecidos o rodeiam; paletó e camisa de riscado claro, calças de brim escuro; alpercatas reluzentes de ilhoses amarelos; a tiracolo, dois pesados embornais de balas e bugigangas, protegidos por uma coberta e xale finos; tórax guarnecido por três cartucheiras bem providas; ágil como um felino, mas aparentando constante estropiamento e exaustão; às mãos o fuzil e à cinta duas pistolas “Parabelum” e um punhal de setenta e oito centímetros de lâmina: eis Virgolino Ferreira da Silva – LAMPIÃO – duende das estradas, assombração das matas e caatingas! Leonardo Mota.

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